Webinar 2: Introduction to CWA 95000 and Its Relevance to Brazil

No dia 17 de junho de 2025, foi realizado o segundo webinar da série Shaping Innovation in Brazil, organizado pela Lawgorithm. O objetivo do evento foi apresentar os princípios do documento CWA 95000, elaborado no âmbito da União Europeia, e discutir suas potenciais repercussões para o Brasil no contexto das patentes essenciais a padrões tecnológicos (Standard Essential Patents – SEPs) e dos compromissos FRAND (Fair, Reasonable and Non-Discriminatory). O painel contou com exposições de Brian Scarpelli (ACT – The App Association), Celso Santos (TRF-2), Alexandre Zanatta Miura (FASADV) e Tatiana de Macedo Nogueira Lima (DEE/CADE), com moderação de Bernardo Fico (Lawgorithm).

Exposição inicial — Fundamentos do CWA 95000

Brian Scarpelli iniciou explicando a lógica dos padrões tecnológicos, destacando seu papel na interoperabilidade de produtos e serviços, como no caso das redes Wi-Fi. Detalhou o funcionamento das organizações de definição de padrões (Standard Setting Organizations – SSOs), que frequentemente incorporam tecnologias patenteadas, desde que seus detentores assumam compromissos FRAND.

Apresentou, então, o processo de elaboração do CWA 95000, documento desenvolvido no âmbito da CEN-CENELEC, com participação de empresas de setores diversos, incluindo telecomunicações, automotivo, semicondutores, energia e mídia. O objetivo do documento, explica Brian, é definir princípios claros para negociações de licenciamento de SEPs, promovendo equilíbrio entre titulares de patentes e implementadores.

Os seis princípios centrais do CWA 95000:

1. Restrições ao uso de medidas judiciais (injunctions) — Limitadas a situações excepcionais, evitando seu uso como instrumento de pressão.

2. Disponibilidade universal de licenças — Obrigação de licenciar qualquer interessado, independentemente de sua posição na cadeia produtiva.

3. Metodologia de valoração baseada no mérito técnico da patente — O valor da licença não pode ser inflacionado com base no uso comercial posterior ou no fato da patente estar incluída em um padrão.

4. Vedação a práticas abusivas de agrupamento de patentes (bundling) — Não se pode condicionar a licença de uma SEP à aceitação de licenciamento de patentes não essenciais.

5. Limitações no uso de acordos de confidencialidade (NDAs) — O uso excessivo de NDAs pode distorcer a transparência e dificultar a verificação de observância dos termos FRAND.

6. Continuidade dos compromissos FRAND após transferência da patente — As obrigações acompanham a patente, mesmo que ela seja transferida para terceiros.

Ao final, Scarpelli reforçou que o CWA 95000 é um instrumento de soft law, mas com relevância significativa no ambiente europeu, sendo cada vez mais considerado em discussões judiciais e políticas públicas fora da Europa.

Perspectiva do Judiciário dos Desafios Regulatórios no Brasil

Celso Santos trouxe a perspectiva prática do Judiciário brasileiro, que tem sido frequentemente acionado em disputas relacionadas a patentes essenciais, muitas vezes na busca por medidas liminares que suspendam a comercialização de produtos. Explicou que, historicamente, o Judiciário brasileiro concedia essas medidas com base na titularidade da patente, mas que há uma mudança em curso. Atualmente, exige-se a demonstração de boa-fé nas negociações prévias, o que inclui oferta de termos FRAND e tentativas efetivas de acordo.

Panorama legislativo e regulatório brasileiro

Alexandre Miura contextualizou o debate no âmbito da política pública brasileira, destacando que, embora não haja regulação específica sobre SEPs, o tema foi incorporado à Estratégia Nacional de Propriedade Intelectual (ENPI)..

Apontou que o Brasil enfrenta um dilema típico das economias em desenvolvimento: adotar modelos mais intervencionistas, espelhado nas normas europeias, ou seguir uma abordagem mais liberal, como a dos Estados Unidos. Também ressaltou que o Brasil não diferencia, do ponto de vista legal, as SEPs das demais patentes.

Análise concorrencial e desafios para o CADE

Tatiana informou que o CADE atualmente conduz um estudo sobre os impactos das SEPs e práticas FRAND no mercado brasileiro, apesar de o Cade ter sido pouco acionado nestas questões, com apenas dois casos até hoje. Reforçou a percepção de Celso Santos e Alexandre Miura de que o Judiciário tem sido o principal espaço de resolução dessas disputas.

Destacou que um dos principais desafios está na definição objetiva do que é “justo, razoável e não discriminatório”, uma vez que a forma das negociações, muitas vezes protegidas por NDAs, torna difícil aferir parâmetros de mercado.

Discussões principais

  • Observou-se que o Brasil está em uma posição para construir sua abordagem regulatória sobre SEPs, podendo aprender tanto com as boas práticas quanto com os erros de outras jurisdições, como Estados Unidos, União Europeia, Reino Unido e Índia.

  • Destacou-se que, apesar de não existir diferenciação legal entre patentes essenciais e não essenciais no Brasil, há consenso sobre a necessidade de tratar as SEPs de forma diferenciada, considerando seu papel para mercados definidos por padrões tecnológicos.

  • Foi reiterada a importância de exigir demonstrações de boa-fé nas negociações FRAND como condição para a concessão de medidas liminares pelo Judiciário. Essa necessidade tem ganhado força no Brasil, alinhando-se a práticas adotadas em outras jurisdições.

  • Debateu-se o uso de medidas liminares como ferramenta de pressão em negociações, o que, em muitos casos, torna o Judiciário mais atrativo do que o Cade para resolução dessas disputas.

  • Discutiu-se se o Brasil deveria avançar para uma regulação específica, com instrumentos de soft law (como guias, similares ao japonês, por exemplo) ou até mesmo uma legislação.

  • Foi ressaltado que o estudo em andamento no Cade, com previsão de conclusão para o segundo semestre de 2025, poderá ter papel importante como insumo técnico para subsidiar tanto formulações normativas quanto aprimoramentos das práticas judiciais e administrativas.

  • Apontou-se que temas como definição de royalties justos, avaliação da essencialidade das patentes, governança das organizações de definição de padrões (SSOs) e o papel das entidades não praticantes são desafios concretos e centrais para qualquer modelo regulatório.

Conclusão

O debate revelou que o tema das patentes essenciais a padrões (SEPs) é central para o desenvolvimento econômico, tecnológico e regulatório, tanto no Brasil quanto no cenário internacional. As discussões evidenciaram que o país se encontra em um momento com oportunidades de aprender com as experiências — e também com os erros — de outras jurisdições.

Ficou evidente que a ausência de diferenciação legal entre SEPs e demais patentes pode gerar insegurança jurídica e desafios para a definição de parâmetros claros nas negociações, na precificação de royalties e na concessão de medidas judiciais. Nesse contexto, foi destacada a crescente relevância de critérios como a demonstração de boa-fé nas negociações, o fortalecimento da transparência e a definição de metodologias para avaliação de essencialidade e determinação de royalties.

O estudo em andamento pelo Cade surge como uma etapa relevante nesse processo, funcionando como diagnóstico que pode subsidiar decisões legislativas, judiciais e administrativas futuras. Além disso, discutiu-se se o caminho brasileiro deveria se orientar para instrumentos de soft law — como o guia japonês ou o próprio CWA 95000 — ou para uma regulação formal.

Por fim, consolidou-se o entendimento de que o avanço desse debate exige articulação entre governo, autoridades concorrenciais, Judiciário, setor privado e sociedade civil, de modo a construir soluções que promovam segurança jurídica, estimulem a inovação e garantam equilíbrio nas relações contratuais envolvendo SEPs no país.

🔗 Acesse o painel na íntegra aqui: YouTube

🔗 Acesse a apresentação de slides da Tatiana Lima: Slides.

🔗 Acesse a apresentação de slides da Brian Scarpelli: Slides.

🔗 CWA 95000

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Webinar 1: Princípios e Práticas para o Licenciamento de Patentes Essenciais a Standards